Ontem eu fui ao Boston Museum of Fine Arts e fiquei pensando sobre o conceito de museus e sobre isso eu queria escrever. Pensando num homem do seculo 18, antes da fotografia, do cinema, da televisao, ... um museu era a unica forma de popular o seu mundo pictografico interior. E de certa forma, isso nao eh mais possivel hoje em dia.t
Para explicar, um Gedankenexperiment: imagine que voce eh um menino do seculo 18 ou 19, de digamos uns 15 ou 16 anos - voce nunca viu uma fotografia na vida, nao tem internet nem televisao ou cinema e o as imagens que voce tem na sua imaginacao sao todas do que voce ve e do que voce imagina. Pelo menos visualmente existe pouco pra instigar sua imaginacao. Voce nunca viu um chines, nunca foi ao Tahiti e embora voce tenha ouvido falar de mumias, nunca viu um desenho de uma. Voce conhece as varias historias da Biblia, quem sabe voce tenha ouvido historias de viagens a India ou do norte da Africa, mas tudo sao passagens de um livro ou partes de um relato. O objetivo eh pensar nesse personagem imaginario chegando a um museu e vendo pela primeira vez imagens dos anjos, do Exodo, de um pagode japones, uma expedicao a Africa ou um navio em alto mar.
Para esse habitante do seculo 18, ir a um museu eh popular pela primeira vez o seu mundo pictorio. E essa eh uma experiencia que nao temos: nosso mundo de imagens jah foi populado pela televisao e pelo cinema. De certa forma, ao inves de popular sua imaginacao com Bosch, Goya ou VanGogh, nos populamos ela com copias vulgares da televisao e do cinema. E isso empobrece em algum sentido o nosso mundo interior. O ideal seria entrar num museu deixando o seu mundo pictorio pre-adquirido de lado, e tentando lah aprender qual imagem associar a um capitao, um serafim ou o monte Fuji.
Isso eh um proceso complicado e acaba nao funcionando pra mim tao bem quanto eu gostaria. E isso eh triste porque de certa forma isso empobrece minha experiencia de apreciar arte - principalmente da arte europeia.Mas de certa forma, esse processo continua mais ou menos intacto na minha mente para a arte asiatica e para a parte da arte europeia que busca retratar a Asia e outros lugares exoticos - sobre os quais meu mundo interior (pelo menos o pictografico) eh ainda muito pobre. Por exemplo, eu muito aprecio Madame Monet in Japanese Costume que estava no museu de Boston:
Um dos melhores exemplos de arte europeia onde eu ainda consigo olhar e ficar espantado como que vendo um novo mundo sendo revelado dianto dos meus olhos eh Gauguin. Desencantado com a Europa (e com, como ele diz, "tudo que eh artificial e convencional"), Gauguin fugiu de tudo e foi viver no Tahiti. Existe algo "fresh" em Gauguin que eu nao consigo ver nos outros: um certo tipo de leveza e liberdade dificil de achar na maior parte das obras. A ideia de fugir para uma vida simples, com normas sociais descomplicadas onde voce possa viver de "peixe e fruta" (como dizia Gauguin) eh algo que se encontra em varios lugares - como nos poetas romanticos brasileiros - mas em nenhum lugar eu consigo me sentir tao afastado do peso da civilizacao como nos seus quadros do Tahiti:
Saindo da arte europeia, o mesmo misterio e sensacao de ter meu mundo interior sendo populado eu consigo ainda encontrar nas pinturas chinesas e japonsas. Assim como nas estatuas do Camboja, Vietnan, Indonesia, ... A Asia e o Pacifico ainda sao misterios aos quais a Chinatown de NYC nao consegue satisfazer. Fiquei impressionado com o templo budista japones reconstruido dentro do museu: com as tres estatuas do Buda Presente, Buda Passado e Buda Futuro e seus guardiaos. Fiquei impressionado com a leveza dessa peca Khmer e a elegancia dessa peca vietnamita.
Jah a algum tempo eu gosto muito de gravuras japonesas e o Boston MFA tem a maior colecao delas fora do Japao. Alem de belos exemplos de Hiroshige, existe uma grande colecao de Kunisada que eu descobri recentemente. Aqui um link para os Kunisadas de Boston. Uma boa maneira de terminar um post eh com gravuras japonesas:
e terminando com "Narumi: The Fifty-Three Stations of the Tokaido" por Kurisada e Hiroshige:
Um comentário:
Interessante. No meu caso, as imagens formadas mais ajudaram do que atrapalharam.
Eu não sou nenhum aficionado por museus, mas nas poucas(íssimas) vezes que fui a um, as imagens dos quadros/esculturas que eu tinha na mente me ajudaram muito a apreciar a obra. Mais especificamente, acho que as únicas obras que eu parei para ver foram as que eu já havia tido algum tipo de contato anterior. Por outro lado, é possível que isso tenha sido porque eu estava "in a hurry", e não pude parar em cada ligar...
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